quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Aquele amigo

                                                             Aquele amigo




Todo mundo tem “aquele” amigo. Que entende cada uma das nossas bobagens, que dá corda às nossas paranóias, que ri da gente na nossa cara e chora no nosso ombro. Aquele amigo que é mais nosso do que dos outros, que conversa pelo olhar (o que é muito útil para se comunicar de longe...rs), e é a primeira pessoa que surge na nossa mente quando algo importante acontece (e precisa ser compartilhado). Que sabe cada uma das nossas respostas, sem a gente precisar dizer. Com quem nunca é chato estar. Que dá sentido a cada ideia super maluca que a gente tenha (mesmo que com argumentos inventados, só pra gente se sentir menos maluco). E que, quando necessário, diz aquilo que a gente precisa escutar, não só o que a gente quer. Aquele amigo é em quem depositamos toda a nossa confiança, e que acreditamos que será tão amigo a vida inteira quanto é agora.
  Mas nem sempre é assim. A vida às vezes dá voltas. E às vezes dá um mortal duplo carpado, e a gente aterrissa de cara no chão, sem saber bem onde foi parar. E percebemos que estávamos encarando como “aquele” o amigo errado. Tanto tempo e energia dedicados à quem não tinha a intenção de retribuir, afinal. O vento levara cada “pra sempre” falado. Aquilo que pensávamos ser permanente, aos poucos se dissolve. Acaba. Não acontece de uma vez, como possa parecer. É que só queremos admitir quando não há mais meio de negar. Fechávamos os olhos para cada sinal, ignorávamos cada evidência de que aquilo não estava mais funcionando como antes, de que aquele coração estava pouco a pouco se afastando do nosso. Até que somos obrigados a enxergar que aquilo não é (talvez não mais, talvez nunca tenha sido) tão profundo como fora antes.
  Geralmente o que parece mais inquebrável é o que tem mais chances de nos cortar com os cacos. Aquilo em que mais depositamos confiança é o que mais tem poder de nos ferir quando falha. E, pode ser até que essa falha sempre estivesse lá, e somente os nossos olhos eram incapazes de ver.
   É doloroso vê-lo se perder da gente. Mas é ainda mais devastador vê-lo se perder dele mesmo, e do bom caminho que percorríamos juntos. Talvez nos sintamos culpados por não ter conseguido ajudá-lo o suficiente, apesar de todo o esforço. Mas é bom lembrar que o erro de uma pessoa nunca é por culpa de outra. Muito provavelmente nada do que tivéssemos feito de diferente poderia ter tido qualquer efeito sobre sua decisão. Isso porque, por mais maravilhoso que seria se fosse possível, não podemos tomar decisões por ninguém além de nós mesmos. Nos cabe apenas aconselhar tanto quanto possível, e esperar pelo melhor.
  Talvez ele esteja apenas perdido no meio de uma tempestade. E, por mais que a nossa vontade seja sempre estender um braço firme em que ele possa se agarrar, e puxá-lo para onde sabemos ser o lugar mais seguro, temos que aceitar caso ele esteja lá por vontade própria, ou por uma falsa sensação de extrema liberdade. Ficarmos lá, estendendo o braço com todas as nossas forças para alguém que não está à procura de um abrigo, só vai nos desgastar, tirar nossa paz, ferir nossos sentimentos.
  Não se pode ajudar quem não quer ser ajudado. Não se pode cobrar amizade de quem não a tem para dar. As pessoas só podem dar aquilo que tem, por isso não se pode cobrar paz de quem vive em turbulência. Ou amor de quem só possui indiferença. Não é justo carregar a falha do outro nos ombros, e nem cobrar de nós mesmos reparações. Não cabe a nós. O que podemos fazer por ele é orar, esperar pelo melhor, e estender, não só um, mas os dois braços, para dar um abraço sufocante caso ele reconheça seu erro e dê meia volta. E o que podemos fazer por nós é manter nossa paz, e aceitar que não podemos interferir tanto quanto gostaríamos nas decisões de ninguém, que a ajuda que podemos dar é limitada, e procurarmos não perder a alegria. E, caso ela acabe se perdendo por um tempo, que possamos descobrir que ela pode ser reencontrada em muitos outros lugares, situações e pessoas.


*MaRi Rezk*